A cláusula penal, regulada pelos arts. 408 a 416 do Código Civil/2002 (CC/02) é um elemento essencial em muitos contratos, pois estabelece uma penalidade para a parte que não cumprir suas obrigações contratuais. Ela serve como um mecanismo de proteção e incentivo ao cumprimento das obrigações acordadas.
Segundo Paulo Lôbo, a cláusula penal “é a fixação prévia de uma prestação adicional, no negócio jurídico, quase sempre consistente em uma soma em dinheiro, como consequência pelo inadimplemento ou adimplemento insatisfatório a que se submete o devedor ou, eventualmente, terceiro.”
Identificação e Aplicação
A cláusula penal pode ser identificada no contrato como uma disposição que prevê uma penalidade em caso de inexecução ou atraso no cumprimento das obrigações. As situações que autorizam sua aplicação incluem:
Culpa na inexecução ou atraso: Quando uma das partes não cumpre ou atrasa o cumprimento de suas obrigações.
Inexecução completa da obrigação: Quando a obrigação não é cumprida de forma alguma.
Inexecução de cláusula específica: Quando uma cláusula específica do contrato não é cumprida.
A cláusula penal é uma obrigação acessória que depende de consentimento das partes, seja no contrato ou em pacto posterior, como nos aditivos contratuais (art. 409, CC/02).
Características
Algumas características importantes da cláusula penal incluem:
Limitação: O valor da pena não pode exceder o valor da obrigação principal (art. 412, CC/02). Claro que, em negócios submetidos à legislação especial, o limite pode ser diferente do previsto no Código Civil.
Indenização suplementar: Pode ser exigida, mas deve estar expressamente prevista no contrato. Com a previsão, a cláusula penal passa a ser considerada o mínimo da indenização e nesse caso, será necessário que o credor prove o prejuízo excedente (art. 416, parágrafo único, CC/02).
Desnecessidade de prejuízo: Para exigir a pena, não é necessário provar o prejuízo (art. 416, CC/02).
Funções das cláusulas penais
Existem duas funções que as cláusulas penais podem exercer nos contratos (art. 408, CC/02):
Função compensatória/indenizatória: Funciona como uma prefixação de perdas e danos.
Pode limitar a responsabilidade e prever indenização suplementar, desde que expressa. Usar esse tipo de cláusula penal poupa as partes do tempo e custo de um processo judicial de liquidação de prejuízos, já que não será necessário provar o prejuízo.
Por outro lado, tal cláusula não pode ser disposta sem uma análise mais aprofundada dos riscos a que o negócio está submetido (art. 410, CC/02).
Para que a cláusula penal indenizatória possa substituir a indenização que seria cabível, o inadimplemento da obrigação tem que ser total ou absoluto. Assim, a cláusula compensará o adimplemento que não ocorreu e a indenização respectiva (art. 410 do CC/02).
Não obstante, as partes podem prever que a indenização por perdas e danos será cumulada com a cláusula penal.
Nos casos em que houver a pactuação da cláusula penal compensatória, o credor terá duas alternativas:
Buscar a execução específica da prestação, sem prejuízo das perdas e danos pelo atraso, ou
Buscar a aplicação da cláusula penal, se estiver diante de inadimplemento absoluto.
Caso o inadimplemento seja parcial, o credor poderá devolver o que recebeu do devedor e cobrar a totalidade da cláusula penal, ainda que não tenha sofrido prejuízo, ou a cláusula penal poderá ser reduzida equitativamente, conforme dispõe o art. 413 do CC/02.
Função moratória: Atua como sanção pelo atraso no cumprimento da obrigação, permitindo a exigência da pena juntamente com a obrigação principal (art. 411, CC/02).
Diferente da cláusula penal compensatória, a cláusula penal moratória tem como objetivo forçar o devedor a cumprir a obrigação e dessa forma pode ser exigida juntamente com a obrigação principal (art. 411 do CC/02).
A cláusula penal moratória também será aplicada quando houver inadimplemento de ‘qualquer das cláusulas’ especificadas no contrato. Nesse caso, não será cláusula penal compensatória, pois não se trata de inadimplemento absoluto, mas sim inadimplemento relativo.
No entanto, algumas cláusulas são tão importantes para a essência do negócio que sua quebra pode representar um inadimplemento absoluto, de forma que pode ser pactuada cláusula penal compensatória por força da característica dispositiva dos arts. 410 e 411 do CC/02.
Distinção da função da cláusula penal
Muitas vezes, as terminologias adotadas no contrato acabam por prejudicar a verificação do tipo de cláusula penal. Assim, o intérprete terá que se valer de indícios para distinguir as cláusulas penais aplicadas no caso concreto.
A distinção é fundamental. A depender da função desempenhada pela cláusula penal, deve-se estar atento às normas aplicáveis, vez que as regras serão distintas.
Assim, é importante que a redação das cláusulas contratuais seja feita por profissional que entenda os institutos jurídicos contratuais.
Possibilidade de redução da cláusula penal
Embora as partes tenham liberdade para pactuar o conteúdo do contrato, tal liberdade encontra limites. Um desses limites, quanto à cláusula penal, está disposto no art. 412 do Código Civil.
Ainda, caso a cláusula pactuada, mesmo dentro do limite disposto no art. 412, se mostre manifestamente excessiva, é possível que ela seja reduzida equitativamente pelo juiz, considerando a natureza e a finalidade do negócio. É o que dispõe o art. 413, CC/02.
O dispositivo que trata sobre a redução da cláusula penal é considerado norma de ordem pública. Dessa forma, além do juiz poder reduzir equitativamente de ofício, as partes não podem renunciar a redução quando ocorrer as hipóteses do art. 413 do CC/02, ou seja, se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.
Aplicação em contratos consumeristas
Diferente do limite de 10% (dez por cento) sobre o valor da dívida aplicado nos contratos civis (Lei da Usura, art. 9º), as multas pela mora decorrentes do inadimplemento não podem ser superiores a 2% (dois por cento) ao valor da prestação (art. 52, § 1º do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Cláusula penal, danos morais e demais efeitos do inadimplemento
A indenização a que está relacionada a cláusula penal não refere-se a danos morais. Isso porque, os danos morais não podem ser limitados, sob pena de violar dispositivos constitucionais.
Por outro lado, a cláusula penal não abarca os juros, atualização monetária e honorários advocatícios pactuados no contrato, pois, devido à sua função, a cláusula penal substitui as perdas e danos diretos causados pelo inadimplemento não alcançando, portanto, os efeitos acessórios.
Pactuação da cláusula penal e faculdade de sua aplicação
Existe controvérsia na doutrina sobre a faculdade de aplicação da cláusula penal pactuada entre as partes. Poderia o credor abrir mão de cobrar a indenização pactuada e buscar a liquidação das perdas e danos, caso entenda que assim terá maior ganho?
Veja o entendimento da doutrina:
1ª Corrente: Seria possível. Para essa corrente, a cláusula penal é classificada como obrigação com faculdade alternativa para o credor.
2ª Corrente: Admite a possibilidade caso a cláusula penal seja punitiva e não indenizatória.
3ª Corrente: Não seria possível, vez que a cláusula penal foi avençada exatamente com o objetivo de pré-fixar as perdas e danos, o que traz equilíbrio ao contrato, já que as partes conhecem de antemão quais os riscos a que estão submetidas.
Conclusão
Sendo o inadimplemento atribuído ao devedor, a cláusula penal é uma ferramenta crucial para garantir o cumprimento das obrigações contratuais e proteger os interesses das partes envolvidas. Sua correta aplicação e entendimento são fundamentais para a eficácia dos contratos.
Por Alves & Gomes Advogados
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